quarta-feira, 24 de julho de 2013

"e temo, e espero, e ardo em fogo, e sou de gelo, e quero subir ao céu e caio em terra..."


Petrarca, denominado Pai do Humanismo, devotado em resgatar a antiguidade clássica ao escrever cartas ao poeta Cícero, morto 1200 anos antes de seu nascimento, além der traduzir Homero para o latim. Petrarca, Dante Alighieri, Boccaccio e intelectuais do seu tempo formaram a plataforma para o “Ressorgimento” italiano e o início da literatura humanista européia. Assim como é de Petrarca, o conceito de “Medida Nova” para a lírica italiana, em oposição à antigüidade clássica. A principal característica deste movimento é o afastamento do teocentrismo perante a visão antropocêntrica do pensamento filosófico grego. Os intelectuais defendiam um olhar racional para o mundo, enquadrando o homem como possibilitador tanto para o construir positivo como para o negativo. Poetas do novo, da construção e de transformações. Para se entender a importância da lírica de Petrarca, faz-se necessário um estudo, ainda que na superficialidade, do que representa este gênero literário através dos tempos. Embora a poesia lírica tenha seus fundamentos desde a antiguidade, sua evolução se acentua, na medida em que o homem se revela diante do mundo. Refletindo sobre este mundo e sobre si mesmo, primeiramente, nasce da luta interior para então irromper-se em forma de poesia para além dos limites do eu. A emotividade faz com que a expressão poética apresente verossimilhança, não com a realidade objetiva, mas com a consciência de si mesmo. Distancia-se da narrativa e do drama que tem como suporte o mundo exterior e objetivo. Se os poetas gregos admiravam os atletas e a pátria, e concebiam estes como objetos de suas aspirações poéticas, Petrarca concebia seu estar no mundo em si mesmo e no amor metafísico concretizado em suas canções. Amor cuja existência, ao mesmo tempo em que se limitava à existência do poeta, transcendia em seu ardor e sofrimento extremo.Francesco Petrarca deu forma, métrica e imortalizou o sofrimento pelo amor indefinível através dos convulsionados sentimentos que extraia do social e do político. Modificou a ordem do mundo em relação à lírica e a língua italiana. Compôs os sonetos que em italiano(sonnetto) significa pequena canção ou pequeno som. O soneto, que nascera sob a forma de duas oitavas na corte de Frederico de Florença, sob a ordem de Jacobo Notaro ou Jacobo Lentini se transformara em dois quartetos e dois tercetos na composição Petrarquiana.

II Seminário Nacional em Estudos da Linguagem: 06 a 08 de outubro de 2010
Diversidade, Ensino e Linguagem UNIOESTE - Cascavel / PR


Soneto 134 de Petrarca

A paz não tenho, e sem ter motivo vou à guerra: 
e temo, e espero, e ardo em fogo, e sou de gelo, 
e quero subir ao céu e caio em terra, 
e nada abraço e o universo ando a contê-lo. 
Tal é minha prisão, que não se abre, e não se encerra: 
prende-me o coração, mas sem prendê-lo, 
não me dá vida ou morte, Amor, e erra 
minha alma sob o enorme pesadelo. 
Odeio-me a mim mesmo, alguém amando,
grito sem boca ter, sem olhos vejo,
quero morrer, e a morte me apavora. 
Nutrindo-me da dor, chorando eu rio: 
igualmente não me importam a morte e vida:
eis o estado em que me encontro, Senhora, por vós.


DONNA, CHE LIETA COL PRINCIPIO NOSTRO

Senhora minha, que tão leda estais 
Coo princípio de tudo, e o mereceste 
Por essa vida santa que viveste, 
E em sédia gloriosa vos sentais, 

Ó rara e portentosa entre as demais, 
Ora, no Olhar que tudo vê celeste, 
Vê o meu amor e a pura fé que veste 
De lágrimas choradas versos tais. 

E sente um coração tão fiel na terra 
Qual o é no céu agora, e que não tende 
A mais de ti que ao Sol dos olhos teus. 

E pois, para vencer a dura guerra 
Que neste mundo só a ti me prende, 
Roga que eu vá depressa a estar nos céus. 


ITE, RIME DOLENTI, AL DURO SASSO

Oh, vai, verso dolente, à pedra dura 
Que o meu caro tesouro em terra esconde, 
E chama quem do céu inda responde, 
Se bem que o corpo esteja em tumba escura. 

Diz-lhe que vivo exausto de amargura, 
De navegar sem já saber por onde, 
Salvando apenas sua esparsa fronde 
De perder-se na morte que se apura, 

Sempre arrazoando dela, viva e morta, 
Como se viva e já feita imortal, 
Para que o mundo a reconheça e ame. 

E que lhe praza ser quem me conforta 
No instante que se apressa. Venha e, qual 
Está no céu, a si me leve e chame. 



ANIMA BELLA DA QUEL NODO SCIOLTA 

Alma tão bela desse nó já solta 
Que mais belo não sabe urdir natura, 
Tua mente volve à minha vida obscura 
Do céu à minha dor em choro envolta. 

Da falsa suspeição liberta e absolta 
Que outrora te fazia acerba e dura 
A vista em mim pousada, ora segura 
Podes fitar-me, e ouvir-me a ânsia revolta. 

Olha do Sorge a montanhosa fonte 
E verás lá aquele que entre o prado e o rio 
De recordar-te e de desgosto é insonte. 

Onde está teu albergue, onde existiu 
O amor que abandonaste. E o horizonte 
De um mundo que desprezas, torpe e frio. 



terça-feira, 23 de julho de 2013

"apenas pedem que eu os acomode em algum canto de minha humilde morada..." Petrarca


Tenho amigos cuja companhia me é extremamente agradável: são de todas as idades e vêm de todos os países. Eles se distinguiram tanto nos escritórios quanto nos campos, e obtiveram altas honrarias por seu conhecimento nas ciências. É fácil ter acesso a eles: estão sempre à disposição, e eu os admito em minha companhia, e os despeço, quando bem entendo. Nunca dão problemas, e respondem prontamente a cada pergunta que faço. Alguns me contam histórias de eras passadas, enquanto outros me revelam os segredos da natureza. Alguns, pela sua vivacidade, levam embora minhas preocupações e estimulam meu espírito, enquanto outros fortificam minha mente e me ensinam a importante lição de refrear meus desejos e de depender só de mim. Eles abrem, em resumo,  as várias avenidas de todas as artes e ciências, e eu confio em suas informações inteiramente, em todas as emergências. Em troca de todos esses serviços, apenas pedem que eu os acomode em algum canto de minha humilde morada, onde possam repousar em paz – pois esses amigos deleitam-se mais com a tranquilidade da solidão do que com os tumultos da sociedade.

Francesco Petrarca.

Salve-me, e eu te salvarei.



Francisco Petrarca (1304-1374) nasceu em Arquá, na região da Mântua. Passou a infância em Valdarno, mas transferiu-se para Pisa com a família. Em Avignon, fez seus estudos em gramática, dialética e retórica. Posteriormente, cursou direito em Bolonha e Montepelier. Com a morte do pai, tentou a vida monástica, mas logo abandonou. Numa sexta-feira santa, conheceu Laura de Novaes, musa que o inspirou durante a vida inteira. Petrarca era um grande investigador dos clássicos da literatura antiga. Por isso, foi considerado um dos primeiros grandes bibliófilos da Europa. Dedicou-se à poesia a partir de 1337. Recebeu título de poeta laureado em Roma, sucesso que alcançou ainda vivo. Foi grande sonetista e humanista, orador eloquente e um dos precursores do renascimento italiano. Petrarca escreveu mais de 300 sonetos. Das obras líricas, a mais importante é “Canzoniere e o Trionfi” (Triunfos). Dos ensaios e cartas, destaca-se o “Secretum” (Meu Livro Secreto), escrito em latim. Escreveu tratados, entre eles o “Rerum Memorandarum Libri”, que versava sobre questões de ordem moral. O “Itinerarium” (O Guia de Petrarca para a Terra Santa), tornou-se uma espécie de guia de viagem. Importante também é a “Carta para a Posteridade”, uma autobiografia. Petrarca inspirou um movimento poético, o petraquismo, o qual conseguiu muitos adeptos entre o século XV e XVII. Encontrar as riquezas dos ensinamentos dos autores clássicos nas diversas áreas do conhecimento humano e revitalizar esses conhecimentos continuando a pesquisas que esses autores começaram é a preocupação filosófica de Petrarca, que teve não somente a vontade, mas também a oportunidade e os meios de iniciar a revolução cultural conhecida como humanismo. Petrarca é tido como sendo o primeiro dos humanistas, movimento que está intimamente ligado ao Renascimento. Petrarca busca um mundo ideal que é diferente da sua realidade concreta. Ele discorda dos filósofos de sua época e procura nos antigos uma perfeição intelectual que ele não encontra no mundo que o rodeia. Sobre a possível oposição entre o humanismo e o cristianismo ele afirma que os filósofos antigos não tinham a fé cristã, mas tinham a virtude e na virtude o pensamento antigo e o cristão se encontram e não estão em contradição. Segundo ele a descrença e a irreligiosidade de sua época eram causadas pelo naturalismo do pensamento árabe que tem por base Averróis e pelo uso indiscriminado da lógica e da dialética para analisar áreas do conhecimento que não lhes são próprias. Para solucionar os problemas da fé e da religião devemos direcionar nossos estudos para a nossa própria alma, devemos nos voltar a nós mesmos, esse é um dos primeiros princípios do humanismo. O verdadeiro saber é o saber que temos de nós mesmos. De pouco adianta conhecermos a natureza das coisas e desconhecermos a natureza do homem. Petrarca considera de fundamental importância responder questões como: Por que estamos aqui? De onde viemos e para onde vamos?

biografias.net/francesco_petrarca/http://www.filosofia.com.br/historia_show.php?id=55